domingo

Sonhos

Ao Cara não lhe agradavam os labirintos. Talvez porque a história de Ícaro não tivesse acabado muito bem. Talvez porque pensasse, muitas vezes, que a sua vida parecia um labirinto. Porque não percebía tudo muito bem, ele não gostava de labirintos.


O Cara estava calmamente na sua floresta. Não imaginava saír dali tão cedo.
No entanto,um trabalho urgente na Cidade Grande obrigou-o a viajar.
A primeira etapa, feita de canoa, foi breve. A seguir tinha um longo percurso a fazer - seis, sete horas - num comboio que não primava pelo conforto.
Acomodou a sua mala grande no vagão das bagagens e, com a sua carteira e um livro, procurou o seu lugar. Não havia marcações. Sentou-se num banco, junto à janela, por sinal o único que tinha outros lugares de frente. O resto da composição tinha os bancos dispostos de modo diferente. Ainda antes da partida, cansado das emoções e nervoso pela viagem que ía fazer, encostou a cabeça ao vidro e adormeceu.


Na sua mente desfilavam tempos antigos. Sonhava com facilidade. Foi nessa altura que ela chegou. Sentou-se à sua frente. De idade indefinida, tanto lhe parecia uma menina adolescente como uma mulher na idade de ouro. Tudo dependía do semicerrar dos olhos. Era perfeita. Alta, muito esbelta. O Cara começou a ficar perturbado. O coração, esse orgão tão estranho que, diziam, comandava sentimentos, começou a bater de modo diferente. O Cara olhava-a fixamente tentando perceber qual sería a reacção aos seus olhares insistentes.
E, pareceu-lhe, adormeceu de novo. Ao reabrir os olhos, não quería acreditar no que via. Ela alí estava à sua frente, completamente nua. Um corpo lindo, magro mas não esquelético. Morena, formas perfeitas, uns seios pequenos que pediam um toque, suave. Os seus olhos, verdes (azuis?) eram um lago perfeito onde apetecia mergulhar. As pernas, longas, dobravam-se elegantemente. Naquele preciso momento, com as pernas muito unidas, os seus joelhos tocavam os do Cara. Sem constrangimentos. O Cara olhava-a, entre divertido e ansioso.
Foi nessa altura que ela se chegou à frente. Com toda a naturalidade e um sorriso lindo beijou-lhe os lábios. Um toque apenas, ao de leve. Voltou a recostar-se no banco, sorrindo sempre. O Cara, orfão de carinhos e carícias, queria mergulhar naquele olhar, agarrar os pequenos seios que o chamavam. Queria abraçá-la, ficar ali, eternamente, agarrando aquele momento.
Foi nessa altura que o comboio, por qualquer motivo imprevisto, fez uma brusca paragem. O Cara, talvez pela surpresa, foi projectado para o banco da frente. Que se encontrava vazio. Como sempre estivera desde que a viagem tinha começado.

2 Comments:

At outubro 11, 2006, Anonymous Anónimo said...

Recordei agora uma canção...

"Sonho meu, sonho meu
Vai buscar que mora longe, sonho meu
Sonho meu, sonho meu
Vai buscar que mora longe, sonho meu

Vai mostrar esta saudade, sonho meu
Com a sua liberdade, sonho meu
No meu céu a estrela guia se perdeu
A madrugada fria só me traz melancolia, sonho meu
Sinto o canto da noite na boca do vento
Fazer a dança das flores no meu pensamento
Traz a pureza de um samba
Sentido, marcado de mágoas de amor
Um samba que mexe o corpo da gente
O vento vadio embalando a flor, sonho meu
Sonho meu, sonho meu
Vai buscar que mora longe, sonho meu
Sonho meu, sonho meu
Vai buscar que mora longe, sonho meu..."


Um doce se adivinharem quem a canta, mas não vale irem ao Google... eheh

;)

 
At outubro 12, 2006, Blogger caraecoroa said...

Maria Bethânia?

 

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